Obesidade na infância e adolescência

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Obesidade na infância e adolescência

A obesidade é uma doença crônica e multifatorial com sérias repercussões na saúde. O excesso de peso na infância aumenta o risco de obesidade na adolescência e na vida adulta. A obesidade é uma das principais causas de hipertensão arterial em crianças e adolescentes. No sexo feminino, os problemas ginecológicos relacionados com a obesidade incluem as desordens menstruais e a diminuição da fertilidade na adolescência e na vida adulta. O controle dessa patologia evita a sua evolução para formas crônicas e graves, que acarretaria novos transtornos e consequências para essas jovens. A mudança de hábitos alimentares e a realização de atividade física são a principal linha de tratamento. O tratamento medicamentoso é reservado para portadoras de obesidade grave que apresentam comorbidades associadas e que não respondem às mudanças do estilo de vida. 

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a obesidade é um dos maiores problemas de saúde no mundo, sendo considerada uma doença crônica, multifatorial e o distúrbio nutricional mais comum na infância. O excesso de peso na infância aumenta o risco de obesidade na adolescência e, consequentemente, na vida adulta, com graves repercussões na saúde. Na faixa etária pediátrica, os aspectos genéticos e neuroendócrinos, as mudanças nos hábitos alimentares, o sedentarismo, o uso inadequado de mídias digitais e as disfunções psicossociais contribuem para a patogênese desse importante problema de saúde pública que pode gerar inúmeras morbidades que afetam a qualidade de vida das crianças e adolescentes.(1) A prevalência de obesidade vem aumentando em diversas populações, sendo a obesidade considerada, atualmente, como o maior problema de saúde global (World Health Organization – WHO, 2000),(2) pela sua associação com doenças metabólicas e cardiovasculares.(3) Na América Latina, a prevalência da obesidade pediátrica fica em torno de 18% a 36% entre os indivíduos de 5 a 11 anos e de 16% a 35% no caso dos adolescentes, segundo dados da Organização Pan-Americana da Saúde.(4) No Brasil, Aiello et al. (2015)(5) realizaram uma revisão sistemática com metanálise, na qual identificaram que a prevalência de obesidade foi de 14,1% entre crianças e adolescentes. Foi identificado, nesse estudo, que 6,5% das crianças menores de 2 anos de idade no país tinham sobrepeso e/ou obesidade infantil.(5) Esses dados epidemiológicos são relevantes, uma vez que a chance de crianças acima do peso se tornarem adultos obesos é de 25% e a de adolescentes obesos, de 75%, além de haver diversos riscos à saúde física e mental.(6) O diagnóstico clínico da obesidade na infância e adolescência é realizado pelo índice de massa corpórea (IMC), conforme preconizado por Quetelet (Peso/Estatura2 ), e interpretado de acordo com os pontos de corte mostrados na tabela 1.

REPERCUSSÕES DA OBESIDADE NA INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA

Existe uma frequente associação da obesidade com doenças crônicas na fase adulta, as quais podem surgir durante a infância, proporcionando prejuízos para a imunidade, a autoestima, o adequado convívio social e também o desempenho escolar.(8) A obesidade está associada a várias complicações que afetam órgãos e sistemas, entre elas: doença cardiovascular (DCV), hipertensão e dislipidemia, pré-diabetes e diabetes tipo 2, osteoartrite, asma, associação com síndrome dos ovários policísticos e infertilidade.

RISCOS METABÓLICOS E CARDIOVASCULARES

A obesidade é uma condição na qual a reserva natural de energia estocada no tecido adiposo está aumentada por um desequilíbrio entre a energia obtida pela alimentação e a energia gasta, cujas consequências são a hiperplasia e a hipertrofia do adipócito.(9) Além da função de armazenamento e mobilização de gorduras, o tecido adiposo é um órgão endócrino que libera adipocinas, como o fator de necrose tumoral alfa (TNFα), a interleucina-6 (IL-6), a leptina e a adiponectina, que podem ter a sua produção afetada na obesidade. O aumento de TNFα, IL-6 e leptina contribui para o estado pró-inflamatório, trombótico, hipertensivo e de resistência insulínica (RI) característico da obesidade.(3) Existem evidências de que os níveis sanguíneos dessas citocinas se encontram mais altos em indivíduos com excesso de peso, inclusive em crianças e adolescentes.(10) A observação de que nem todas as mulheres obesas apresentam RI ou risco elevado para DCV levou à hipótese de que não seria o excesso de gordura corporal total, mas a distribuição da adiposidade visceral (também chamada de androide, troncal ou central), que teria maiores implicações na constelação de anormalidades relacionadas à RI.(11,12) A insulina apresenta um efeito antilipólise, estimulando a síntese da lipase lipoproteica, enzima cuja ação é hidrolisar os triglicerídeos, permitindo o seu armazenamento na célula gordurosa.(13) Os adipócitos abdominais hipertrofiados nas pessoas obesas são caracterizados por um estado hiperlipolítico, que é resistente à insulina. O aumento da lipólise visceral acarreta uma maior oferta de ácidos graxos livres para o fígado, estimulando a produção hepática de glicose e favorecendo a hiperinsulinemia.(12) Os eventos agressores podem acontecer ainda na infância, porém os sinais clínicos da aterosclerose geralmente só aparecem na fase adulta.(10) A obesidade é uma das principais causas de hipertensão arterial em crianças e adolescentes, favorecendo complicações cerebrais e cardiovasculares futuras. Tanto a pressão sistólica como a diastólica aumentam com o aumento do IMC. Há relação estreita entre pressão arterial e peso corporal, ocorrendo redução da pressão arterial com a perda de peso. Outro mecanismo aventado como responsável pelo aumento da pressão arterial, na obesidade, é a diminuição da excreção de sódio (Na+ ) causada pelo hiperinsulinismo. Observou-se que o sistema renina-angiotensina-aldosterona está estimulado no obeso, especialmente nos indivíduos com obesidade abdominal, podendo também explicar o aumento da pressão arterial.(14)

ALTERAÇÕES POSTURAIS E ARTICULARES

A obesidade na criança determina uma mudança do centro da gravidade corporal para a região anterior por causa do aumento do volume abdominal, o que gera alterações posturais. Existe uma acentuada lordose lombar e aumento da inclinação anterior da pelve. De forma compensatória, a criança obesa apresenta uma cifose dorsal e lordose cervical acentuadas, resultando em deslocamento anterior da cabeça, arredondamento dos ombros e achatamento anterior do tórax. A principal consequência desse quadro, a longo prazo, seria o encurtamento das estruturas músculo-ligamentares, levando a alterações na marcha, dores articulares e surgimento de deformidades distais como joelhos valgos e/ou hiperextensíveis e pés planos valgos.(10)

ALTERAÇÕES DERMATOLÓGICAS

As alterações dermatológicas mais encontradas na obesidade são as estrias, fragilidade da pele nas regiões das dobras, celulites, acanthosis nigricans, flacidez de pele, tendência a infecções e, mais raramente, úlceras.(15) As estrias tendem a ser bilaterais, distribuindo-se simetricamente nos dois hemicorpos.(16) Elas surgem como lesões eritêmato-purpúricas que evoluem para alterações brancas e atróficas. Fatores mecânicos, hormonais e genéticos contribuem para o seu aparecimento.(17) Celulite é uma afecção frequente que atinge preferencialmente as mulheres, sendo causa de desconforto estético. Ela surge a partir de mudança do tecido gorduroso, dos tecidos conectivos e dos vasos, influenciada pelo estrogênio.(15) A acanthosis nigricans é caracterizada pelo espessamento, hiperpigmentação e acentuação das linhas da pele, gerando aspecto grosseiro e aveludado no local afetado.(18) Apresenta-se como placas hipercrômicas, de superfície papilomatosa, vegetante ou liquenificada, de coloração castanho-escura a preta, localizada nas axilas, virilha, região cervical e outras áreas intertriginosas e é um marcador clínico da RI.(17) A flacidez pode apresentar-se de duas formas distintas: a flacidez muscular e a da pele. É comum as pessoas obesas apresentarem os dois tipos associados. Os músculos ficam flácidos, principalmente por causa da falta de exercícios físicos.(15) Os cuidados dermatológicos em pacientes obesos merecem atenção especial, principalmente devido à dificuldade na cicatrização de ferimentos. Além disso, existe o aumento do risco de infecções cutâneas e de linfedema, o que contribui para maior morbidade nessa população. Em pacientes hospitalizados, a obesidade leva ao aumento do risco de úlceras de pressão, além do retardo na cicatrização, o que deve ser manejado principalmente com medidas preventivas.(15) O impetigo, também chamado de piodermite, é uma infecção na superfície cutânea causada pela penetração de bactérias na pele por feridas e prurido. É causado por Staphylococcus ou por Streptococcus e caracteriza-se por pústulas. Pode aparecer em qualquer parte do corpo, embora seja mais frequente na face, nos braços e nas pernas.(17) A celulite de origem infecciosa resulta do acometimento da derme e tecido celular subcutâneo, é caracterizada por eritema, edema e dor e geralmente é causada pelo Streptococcus beta-hemolítico do grupo A e S. aureus nos adultos e H. influenzae tipo B em crianças com menos de 3 anos de idade.(19)

DISTÚRBIOS RESPIRATÓRIOS

Na obesidade, podem ocorrer alterações da função pulmonar, com diminuição do volume residual, da capacidade vital e do volume expiratório máximo e tendência para redução geral do volume pulmonar. Distúrbio do sono, como dificuldade respiratória associada com déficit de atenção e sonolência durante o dia, pode interferir na vida de crianças em idade escolar. Nas formas graves de obesidade, pode ocorrer a síndrome de obesidade/ hipoventilação, caracterizada por hipoventilação, hipercapnia, sonolência diurna e apneia do sono, representando importante causa de comorbidade da obesidade. O reconhecimento dessas alterações é essencial para a adoção de estratégias, tais como o uso de pressão positiva contínua das vias aéreas.(14,20)

REPERCUSSÕES NA PUBERDADE

Vários estudos têm relacionado a diminuição da idade da puberdade em meninas com o aumento crescente da obesidade infantil.(21) O ganho de peso excessivo na primeira infância, pré-puberdade e puberdade está associado a idade precoce da menarca. O ganho de peso, que ocorre após o nascimento em bebês que sofreram restrição de crescimento intrauterino ou pequenos para a idade gestacional, de acordo com alguns estudos, prediz fortemente uma idade mais jovem na menarca.(22) O elo entre nutrição, adiposidade e alterações neuro-hormonais da puberdade é a leptina, um hormônio derivado dos adipócitos que circula no cérebro e desempenha papel crucial no controle da fome.(22,23) Em ambos os sexos, os níveis de leptina aumentam antes da puberdade, seguido pelo aumento do hormônio folículo-estimulante (FSH), do hormônio luteinizante (LH) e, subsequentemente, dos esteroides sexuais.(22) Estudos indicam que a leptina também tem efeitos gonadais diretos, que podem contribuir para a puberdade acelerada em adolescentes obesos.(23) A obesidade é caracterizada por um estado de hiperleptinemia, secundária à expansão dos adipócitos, associada à resistência a leptina.(22) A hiperleptinemia está associada a hiperinsulinemia, resistência à insulina e consequente diminuição periférica da globulina carreadora de hormônios sexuais (SHBG), aumentando a biodisponibilidade de esteroides sexuais, incluindo o estradiol.(22,24) Além da leptina, a grelina tem se destacado como importante sinal peptídeo orexigênico, que desempenha papel importante na homeostase energética e no controle do peso corporal.  Os níveis de grelina se correlacionam inversamente com o IMC, apresentando-se mais baixos em indivíduos obesos. A grelina apresenta controle inibitório na secreção de LH em animais e humanos em nível hipotalâmico.  Níveis persistentemente elevados de grelina, como um sinal de insuficiência energética, são capazes de inibir a secreção de LH e prejudicar o tempo normal da puberdade.(22) Outro fator que promove o aumento dos níves de estrogênio circulante, em meninas obesas, é a aromatização periférica de andrógenos para estrógenos, no tecido adiposo. Esses fatores relacionadas à supernutrição e à obesidade podem estar associados ao desenvolvimento puberal precoce.(22) Uma revisão sistemática com metanálise de 11 estudos sobre a associação entre obesidade e momento da puberdade observou que o número de meninas com puberdade precoce foi significativamente maior no grupo de obesos do que no grupo de peso normal (risco relativo: 2,44, intervalo de confiança de 95%: 1,32 a 4,52; cinco estudos). Meninas com IMC excessivo têm maior probabilidade de ter telarca entre as idades de 8,0 e 9,6 anos.(22) O estudo de Castilho e Nucci,(25) realizado em uma população de estudantes brasileiros que frequentam escolas públicas e privadas, demonstrou antecipação da idade da menarca em meninas com excesso de peso provenientes de escolas privadas em relação às de escolas públicas (11,6 e 12,3 anos; p < 0,001). Devido aos efeitos deletérios advindos da obesidade e da menarca precoce (como risco de câncer de mama e obesidade na idade adulta), os esforços para a modificação do estilo de vida com o objetivo de diminuir o IMC devem ser intensificados.(22)

REPERCUSSÕES NO CICLO MENSTRUAL

O sobrepeso e a obesidade podem desempenhar um papel na etiologia de alguns distúrbios menstruais. O ganho de peso corporal e o aumento do tecido adiposo, principalmente a adiposidade central, podem levar a um desequilíbrio no balanço dos esteroides hormonais e das SHBG, alterando a liberação de andrógenos e estrógenos nos órgãos-alvo. O tecido adiposo armazena precursores de esteroides, e mulheres obesas apresentam um aumento na produção de estrogênio, sendo frequente o aumento do fluxo menstrual nessas mulheres.(26) Quando o IMC está entre 22 e 23 kg/m2 , a incidência de distúrbios menstruais é baixa, no entanto ela dobra nas mulheres com IMC de 24 a 25 kg/m2 e aumenta cinco vezes com o IMC ≥ 35 kg/m2 . (27) Os distúrbios menstruais são mais frequentes nas mulheres com gordura visceral (tipo androide) do que naquelas com gordura subcutânea (ginecoide). A incidência de alterações menstruais e infertilidade aumenta à medida que aumentam as medidas cintura-quadril.(28) Um achado característico do perfil hormonal de mulheres obesas são os altos níveis de androgênios e LH. Na obesidade tipo visceral, ocorre hiperinsulinemia e insulinorresistência; esta, por sua vez, leva ao espessamento da camada da teca nos ovários, levando ao aumento da produção de androgênios. Além disso, a hiperinsulinemia induz à diminuição das SHBG no fígado, contribuindo para o hiperandrogenismo e, desse modo, influenciando a ovulação e o ciclo menstrual.(27) Obesidade é observada em 60% das mulheres com síndrome dos ovários policísticos (SOP) e contribui para exacerbar as complicações da SOP, incluindo a RI, diabetes tipo 2, DCV, síndrome metabólica e infertilidade. A síndrome metabólica foi identificada em 13,6% (12/44) das adolescentes obesas e com sobrepeso portadoras de SOP.(29)

QUESTÕES PSICOSSOCIAIS

Crianças e adolescentes obesos, de ambos os sexos, apresentam um risco maior de sofrer bullying, considerando-se o estigma corporal facilmente observável. Apelidos e outras estratégias agressivas são usados para a intimidação recorrente, fato que pode levar a isolacionismo social, baixa autoestima, irritabilidade, ansiedade e agravamento do quadro de sofrimento psíquico e prejudicar a adesão ao tratamento. As chances de obesos sofrerem cyberbullying são ainda maiores, quando comparados aos pares de peso normal, e eles costumam apresentar níveis mais elevados de sintomas de internalização, o que implica a necessidade de intervenções preventivas.(30) As relações parentais são muito importantes na condução do processo, evitando fortalecer os estereótipos negativos, e no estímulo positivo às mudanças comportamentais, fortalecendo a autoestima da criança e evitando punições, além de colaborar para a manutenção da qualidade de vida. Famílias disfuncionais apresentam mais dificuldades para vencer esses desafios, o que reflete no maior quantitativo de sintomas depressivos apresentados pelos obesos.(31)

A IMPORTÂNCIA DA PREVENÇÃO DA OBESIDADE NA INFÂNCIA

Ao longo do desenvolvimento e do crescimento infantil, existem vários fatores de risco que contribuem para o aumento da obesidade, como os erros alimentares que se iniciam durante a gestação, o elevado peso ao nascimento e a ausência do aleitamento materno exclusivo até 6 meses de vida e complementar até 2 anos de vida ou mais. A introdução alimentar feita para a criança com alimentos inadequados e o próprio sedentarismo também podem contribuir para a obesidade.(32) A prevenção precoce, desde a infância, representa a melhor maneira de evitar os danos da obesidade na fase adulta. O controle dessa patologia evita a sua evolução para formas crônicas e graves que acarretariam novos transtornos e consequências para essas jovens. Existe uma frequente associação da obesidade com doenças crônicas na fase adulta, que podem surgir durante a infância, gerando prejuízos para a imunidade, autoestima, o adequado convívio social e também o desempenho escolar.(8) Em decorrência das mudanças nos padrões alimentares da população nas últimas décadas, nota-se a necessidade de desenvolvimento de ações governamentais e institucionais de apoio à família. Essas ações teriam o propósito de aprimorar a alimentação das crianças e dos adolescentes na prevenção de doenças, incluindo a obesidade. Historicamente, ocorreram diversas mudanças no contexto social, inclusive a inserção da mulher no mercado de trabalho e da criança, mais cedo, no ambiente escolar. Consequentemente, os hábitos alimentares também sofreram alterações: as refeições mais saudáveis e naturais, preparadas em casa, pela família, foram sendo substituídas pelos alimentos industrializados, ricos em gorduras saturadas e açúcares, a exemplo dos fast food e lanches. Para reverter essa situação, é importante haver uma reeducação alimentar para toda a família, com o intuito de dar o primeiro passo no combate à obesidade infantil. Nesse contexto, o papel dos familiares é imprescindível para o estabelecimento da saúde dos filhos. É fundamental a introdução de uma nova e saudável rotina alimentar, proporcionando, assim, melhor saúde para as crianças e os adolescentes. Uma alimentação ideal nessa faixa etária deve ser tanto qualitativa quanto quantitativamente equilibrada, rica em macros e micronutrientes, e deve conter todos os grupos alimentares – proteínas e leguminosas, cereais, tubérculos e raízes, verduras e legumes, e leite e derivados – indispensáveis para o desenvolvimento e crescimento saudáveis. Em contrapartida, deve-se diminuir e/ou evitar a ingestão de alimentos industrializados e ultraprocessados (p. ex., salgadinhos, biscoitos recheados, bolos empacotados, barrinha de cereal, “danoninho” etc.), de bebidas açucaradas, como refrigerantes,  sucos, chás e achocolatados, e de fast food, já que são alimentos ricos em gorduras, sódio, açúcares e conservantes, de calorias vazias, que tendem a fazer mal ao organismo e a contribuir para o desenvolvimento de doenças crônicas, tais como diabetes, hipertensão arterial, obesidade, entre outras. Vale ressaltar que o exercício físico ou a prática desportiva devem ser encorajados, pelos pais e educadores, desde cedo na vida da criança, uma vez que a prática dessas atividades, juntamente com uma alimentação saudável e variada, contribui para o aumento do gasto energético diário, o que está associado à prevenção de inúmeras doenças metabólicas. Vários estudos têm avaliado o papel anti-inflamatório e cardioprotetor da atividade física regular na obesidade infantojuvenil e no sedentarismo, os quais estão sabidamente relacionados com o maior risco de doenças cardiovasculares no adulto. Uma ação anti-inflamatória se manifesta por meio de menores concentrações séricas de Il-6, de proteína C-reativa e de leptina, e do aumento nos níveis de adiponectina.(33) Outro aspecto importante para que a criança ou adolescente sejam motivados a realizar atividade física é que esta seja fundamentalmente prazerosa.(34) O exercício físico tem papel adjuvante no tratamento da obesidade, pois o gasto calórico proveniente da atividade física se mostra como grande aliado na perda de massa corporal, considerada também fator contribuinte para aumento nos níveis de aptidão física.(35) Weffort e Oliveira (2019) (8) ratificam o que foi dito acima, destacando que há alguns alvos potenciais para a prevenção da obesidade na infância e na adolescência. A criança, inserida no contexto familiar, deve ser estimulada a: consumir frutas, vegetais e cereais integrais; evitar e limitar o consumo de refrigerantes; diminuir a exposição a propagandas de alimentos; evitar o hábito de comer assistindo à televisão. O tamanho das porções deve ser reduzido, respeitando-se a saciedade da criança e evitando insistir que ela coma todo o alimento. As famílias devem estabelecer e respeitar os horários das refeições, limitar o consumo de alimentos ricos em gorduras e açúcares, e promover atividades familiares com o intuito de aumentar a atividade física, como andar de bicicleta e caminhar no parque, em vez de usar veículos. Nos finais de semana, a família, preferencialmente em conjunto, deve realizar atividades que movimentem o corpo, tipo pega-pega e pular corda, a fim de diminuir o comportamento sedentário e aumentar o convívio familiar.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A obesidade deve ser prevenida desde a infância para evitar as repercussões metabólicas, cardiovasculares e reprodutivas na adolescência e na vida adulta. O ginecologista tem um papel importante na orientação dessas pacientes, uma vez que é o médico que acompanha a mulher nas diferentes fases da vida.

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Marta Francis Benevides Rehme1, Márcia Sacramento Cunha Machado2,3, Ivana Fernandes Souza4, Elaine da Silva Pires Araújo5,6, Claudia Barbosa Salomão7, Maria Virginia Furquim Werneck Marinho, Isabel Carmen Fonseca Freitas2,3, Kelley Adriana Gomes Gonçalves8

  1. Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Curitiba, PR, Brasil.
  2. Universidade Federal da Bahia, Salvador, BA, Brasil.
  3. Escola Baiana de Medicina e Saúde Pública, Salvador, BA, Brasil.
  4. Universidade do Sul de Santa Catarina, Palhoça, SC, Brasil.
  5. Universidade Iguaçu, Nova Iguaçu, RJ, Brasil.
  6. Hospital Universitário, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
  7. Hospital Infantil São Camilo Unimed, Belo Horizonte, MG, Brasil.
  8. Hospital Martagão Gesteira, Salvador, BA, Brasil.

Fonte: Revista Femina – Outubro 2020

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