Implante de Gestrinona – uma medicação com efeitos ainda desconhecidos

105

A gestrinona é um esteroide sintético derivado da 19-nortestosterona com propriedades androgênicas, antiestrogênicas e antiprogestagênicas

Foi desenvolvido na década de 1970 como contraceptivo, mas não teve sucesso comercial e, na década de 80, foi utilizado como tratamento de endometriose na via oral. Recentemente, vem sendo utilizada por via subcutânea através de implantes inseridos sob apele do abdômen ou do glúteo após anestesia local. A polêmica envolvida nessa estratégia está na ausência de adequado arcabouço científico com-provando eficácia e segurança, tanto para fins de contracepção como para o tratamento de endometriose. E também, no argumento sedutor de propiciar perda de gordura e aumento de massa muscular (efeito androgênico) como qualificadores secundários do seu uso e assim alcançar um “padrão” de beleza im-posto por nossa sociedade – não por acaso esse implante já foi conhecido como chip da beleza.

Segundo Cristina Laguna, os resultados positivos são pequenos.Muito ao contrário: a gestrinona apresenta ação anabólica e androgênica, que pode causar efeitos colaterais indesejados.

Ensaios clínicos utilizando gestrinona por via oral para tratamento da endometriose evidenciaram risco. Efeitos adversos foram observados e resultaram na suspensão do uso terapêutico desse hormônio, reforçada pelo surgimento de novos métodos mais eficazes e seguros

A administração via implante não necessariamente confere maior eficácia e segurança. Ensaios clínicos com essa via são necessários e a falta de informação sobre a sua farmacocinética é um dos problemas. À ausência de informação é o maior problema

Gestrinona e endometriose

Cristina Laguna destaca ainda que diversas sociedades médicas brasileiras já se manifestaram contra o uso do implante de gestrinona, como a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia(SBEM) e a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), órgão máximo de ginecologia-obstetrícia no país.

Veja, por exemplo, o que diz Júlio César Rosa e Silva, Professor Associado e chefe do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto daUSP diretor do Conselho de Ensino da SBE – Sociedade Brasileira de Endometriose e presidente da ComissãoEspecializada em Endometriose da Febrasgo: ele reforça a preocupante ausência de embasamento científico do método para tratamentos clínicos ou fins estéticos.

O apontamento reflete a importância e necessidade de estudos que demonstrem eficácia e segurança antes da liberação de qualquer medicamento, havendo ainda nos implantes outras questões não esclarecidas, como a quantidade de droga liberada e absorvida no organismo.

Dra. Cristina Laguna
Professora Titular do Departamento de Tocoginecologia, “Responsável pelo Serviço deEndometriose da Universidade Estadual de Campinas, UNICAMP, Campinas, SP; Presidente da CNE de Ginecologia Endócrina da FEBRASGO

Fonte: Revista SOGESP | 2023

Artigo anteriorEndometriose na adolescência – diagnóstico precoce