Explicando a evolução embrionária

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    Louise Brown, o primeiro caso de sucesso de uma fertilização in vitro humana, foi transferida para o útero de sua mãe como um embrião de oito células. Atualmente, devido ao aperfeiçoamento no cultivo de embriões, esse cenário mudou: a maioria dos embriões produzidos em laboratório é transferido ou congelado no estágio de blastocisto.

     

    Diversos motivos e indicações influenciam a decisão sobre qual estágio embrionário se dará a. transferência ou congelamento de embriões. Fisiologicamente, o encontro do óvulo com o espermatozoide (e correta fusão de ambos, processo conhecido como fertilização), bem como as posteriores divisões celulares (clivagens), ocorrem nas tubas uterinas. O embrião, após percorrer toda a tuba, chegará à cavidade uterina em torno do quinto dia pós-fertilização. É quando deverá ter atingido, ou estar próximo de atingir, o estágio de blastocisto para que possa fazer a correta implantação no endométrio. Contudo, sabemos que transferências de embriões provenientes de reprodução assistida ainda em estágio de clivagem são bem sucedidas – como foi no caso de Louise Brown.

     

    A dinâmica em laboratório dá-se da seguinte maneira: após a coleta de óvulos, preparo seminal e injeção intracitoplasmática do espermatozoide (ICSI), o acompanhamento laboratorial dos embriões ocorre pela avaliação de um embriologista capacitado quanto ao processo de fertilização e dinâmica das clivagens. De forma geral, no segundo dia após a fertilização, o embrião deve apresentar entre duas a quatro células – também chamadas de blastômeros. No terceiro dia, o embrião de boa qualidade contém em torno de oito células. Variações na velocidade das clivagens são comuns e normais, tanto entre embriões de uma mesma paciente como entre os blastômeros de um mesmo embrião. Após esse estágio, as divisões celulares vão acontecendo de forma cada vez mais veloz, e o embriologista poderá observar que muitos blastômeros do embrião não apresentam mais um limite definido entre suas membranas, formando um grande aglomerado celular. Assim, dizemos que o embrião está compactando, e a seguir inicia-se a formação da blastocele, formando então o blastocisto.

     

    Dois grupos celulares devem ser observados e avaliados quanto à qualidade em um blastocisto: a massa celular interna, que dá origem ao feto; e o trofoblasto, que origina os anexos embrionários. Além disso, é possível observar uma cavidade contendo líquido, chamada de blastocele.

     

    Todo conjunto celular de um embrião é envolto e protegido por uma membrana gelatinosa, a zona pelúcida. No estágio de blastocisto, o embrião já deverá estar na cavidade uterina e procurará um sítio de implantação. Assim, suas células continuam a aumentar em número, e a blastocele cresce ao acumular mais líquido. Conforme o embrião aumenta em tamanho, a zona pelúcida diminui em espessura até romper. Esse fenômeno é conhecido como hatching, essencial para a implantação do embrião, pois possibilita que as células embrionárias saiam do invólucro e possam invadir o tecido endometrial.

     

    Transferências que ocorrem no quinto dia de evolução embrionária assemelham-se ao processo natural, pois procuram depositar os embriões dentro da cavidade uterina no estágio de blastocisto. Muitos especialistas afirmam que, dessa forma, podemos proporcionar maiores chances de gravidez. Isso porque realizar o acompanhamento dos embriões por mais tempo nos permite selecionar o mais adequado morfologicamente dentro de uma coorte, reduzir o número de embriões transferidos e, consequentemente, diminuir as chances de uma gravidez múltipla.

     

    É verdade que está se tornando uma tendência mundial a transferência de embriões em estágio de blastocisto. No entanto, devemos lembrar que cada caso deve receber um olhar individualizado. Por exemplo: algumas pacientes podem produzir um número pequeno de embriões e, nesses casos, a transferência poderá ocorrer durante os estágios de clivagem para que o restante da evolução embrionária ocorra em ambiente uterino, o que pode trazer algum benefício para os embriões.

     

    O conjunto de informações obtidas pelos embriologistas durante o período laboratorial dos embriões possibilita estimarmos sua viabilidade, qualidade e potencial de implantação no útero. E isso ajudará a definir a melhor conduta para cada paciente.

     

    Shana Flach – embriologista

     

    Fonte: Revista Fertilitat

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